GERAL
14/11/2024 às 16:47 por Patrick Siede


Juíza absolve Samarco, Vale e BHP de acusações de crimes ambientais por tragédia de Mariana

Juíza absolve Samarco, Vale e BHP de acusações de crimes ambientais por tragédia de Mariana
Foto: Douglas Magno/AFP/JC

A juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho, substituta da Justiça Federal de Ponte Nova (Minas), absolveu a Vale, a Samarco e a BHP das acusações de crimes ambientais na tragédia de Mariana - que deixou 19 mortos e lançou 13 mil piscinas olímpicas de lama tóxica no Rio Doce em 2015. A magistrada livrou as empresas de imputações de destruição de bem protegido , poluição, omissão, supervisão de supervisão e falsidade de documento. 

Ao Estadão, o advogado Alberto Zacharias Toron, que representa a BHP, afirmou que a decisão é "longa, minuciosa e mais do que acertada". O advogado indicou ainda que a sentença “não elide a eventual responsabilidade civil das empresas, que está sendo objeto de um grande acordo”. A sentença de 191 páginas assinada na madrugada desta quinta (14), após oito anos de tramitação do processo na Justiça de Minas, sustenta que não há prova suficiente para relatórios , que as empresas não tiveram concorrido para as infrações e ainda cita "atipicidade da conduta" - quando determinada conduta não é prevista como crime.
"Após uma longa instrução, os documentos, laudos e testemunhas ouvidas para a elucidação dos fatos não responderam quais as condutas individuais desenvolvidas de forma direta e determinante para o rompimento da barragem de Fundão. E, no âmbito do processo penal, uma dúvida - que ressoa a partir da prova comprovada no corpo desta sentença - só pode ser resolvida em favor dos réus", anotou a magistrada.

A decisão foi proferida em meio a uma sequência de eventos ocorridos na tragédia de Mariana: a homologação, pelo STF, do acordo de R$ 170 bilhões para caminhões dos danos da tragédia; e o início de julgamento, em Londres, sobre possível às vítimas atingidas pelo tsunami de projetos, no bojo de um processo ambiental coletivo que é considerado o maior do mundo. A juíza uniu uma espécie de preâmbulo à sentença, anotando que tomou "a única decisão possível diante da prova produzida, condenada de que o exercício do poder punitivo em um Estado Democrático de Direito é subsidiário, fragmentário e não pode ser convertido em um instrumento de Direito escapar para a ineficiência das demais formas de controle social”.

Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho cita o acordo de R$ 170 bilhões para prejuízos da tragédia e diz esperar que todos os atingidos pela catástrofe "justa e impactem reparados, consciente de que mesmo a mais vultuosa das indenizações já pagas será incapaz de compensar o que eles foi tomada". Segundo a magistrada, nem uma "sentença penal condenatória proferida em uma miríade de incertezas poderia honrar a memória daqueles que perderam a vida" no desastre.

Falta de provas sobre relação entre missão e desastre

Ao analisar a responsabilidade penal da Samarco antes do rompimento da barragem de Fundão, a magistrada concluiu que, apesar do reconhecimento de omissões de funcionários e da empresa do caso, a falta de prova sobre a relação de causa e feito entre tais omissões e a tragédia ocorreu à absolvição de pessoas e, por consequência, da empresa. O Ministério Público Federal ainda atribuiu à empresa a adoção de política de redução de custos com a segurança de barragens e mau gerenciamento da governança de barragens.

Na avaliação de Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho, as análises realizadas no curso do processo, pela Procuradoria e pela Polícia Federal, não eram conclusivas e indicavam "apenas a sugestão de que a política de redução de custos, imposta pelos anos que antecederam o rompimento da barragem de Fundão, pode ter impactado sem fator de segurança". “A prova dos autos não indica um problema grave na gestão executiva da Samarco que explique o rompimento da barragem de Fundão”, anotou a magistrada.

Deficiência na comunicação poderia levar a relatórios "hipotéticos" por autorresponsabilidade

Por outro lado, Patrícia observou que não havia uma "comunicação devidamente orquestrada" na Samarco. Segundo ela, a deficiência na comunicação ficou evidenciada "em uma situação que pode ter importado para o rompimento da barragem, mas o nexo causal não foi provado no curso da ação". A situação em questão remete a um relatório de 2014 com "impressões técnicas relevantesíssimas" que não foram compartilhadas com a empresa contratada para elaborar o laudo de estabilidade da barragem do Fundão.

"Não se pode afirmar o que teria acontecido se o dito relatório tivesse maior publicidade. [...] Talvez a realização completa do estudo, seguida da construção de uma berma mais robusta, como sugerido pelo consultor, não tivesse impedido ou mesmo retardado o rompimento abrupto da barragem de Fundão. Ou talvez tivesse, e então a barragem não teria se rompido", anotou a juíza. "Impossível determinar sem uma prova técnica (ou pergunta) dirigida a este esclarecimento. E como já fundamentado, não há nos autos qualquer prova que aclare esse nexo causal", sequência.

Patrícia ponderou que este último ponto poderia levar a uma "hipotética" especificada pela Samarco se a legislação brasileira "tivesse evoluído a ponto de admitir a responsabilização criminal da pessoa jurídica fundada em sua autorresponsabilidade".

A juíza ainda refletiu sobre aplicar ao caso - em tal sentido de autorresponsabilidade - um precedente do Supremo Tribunal Federal, mas entendeu que seria necessário que o MPF provasse os "aspectos pertinentes aos critérios de imputação da pessoa jurídica, o que definitivamente não foi feito" .

Com a palavra, o advogado Alberto Zacharias Toron, que representa a BHP

"A sentença da juíza Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho é longa, minuciosa e mais do que acertada. Uma primeira observação que se deve fazer neste caso é que, a despeito de toda dor causada pelas mortes, a despeito de todo mal ambiental causado pelo acidente , a juíza apreciando os fatos, a partir dos relatos que constam no processo e de todas as perícias realizadas, chega à conclusão de que não houve imprudência, imperícia e menos ainda qualquer dolo, mesmo na vontade, mesmo na modalidade eventual, que teve dado causa a esse triste acidente - ao contrário As perícias demonstram que a obra representada pela barragem estava de acordo com a arte desse tipo de edificação Em outras palavras: a obra se apresentou edificada de forma. correta. E ela vai além. Não houve nenhum incremento em termos de atividade de risco que tivesse dado causa ao rompimento da barragem, aliás, é expressivo o fato de que a principal testemunha, o professor Pimenta Ávila, foi expressa na audiência. Frente do Ministério Público, dos juízes, de todos os advogados quando disse que nem Deus poderia prever o rompimento da barragem. Ou seja, no estado em que ela se encontrava era imprevisível o acontecimento. Então, isso não pode ser debitado de maneira nenhuma à Samarco, à BHP, à Vale e aos engenheiros que trabalharam na obra. Portanto é uma sentença que merece aplauso. É bom ressalvar que isso não exclui uma eventual responsabilidade civil das empresas, que obviamente como foi amplamente noticiado está sendo objeto de um grande acordo. Acho que se justiça fez e essa decisão merece aplausos efusivos, porque a Justiça dá a dimensão exata do que é ser juiz penal especialmente num caso como esse que encheu tanta dor e tanto clamor também.”

Fonte: Jornal do Comércio 


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